segunda-feira, 11 de julho de 2011

O Saldão da FLIP






  Terminada a FLIP, qual é o saldo para a literatura, os autores e, principalmente,  os leitores? O saldo é positivo, embora não exista a possibilidade de uma súmula do que o encontro significou, pois os organizadores não apostam (nunca apostaram) na ideia de fazer com que o evento gire em torno de um único assunto. A FLIP não é um Fórum Social Mundial em que é preciso chegar a conclusão, posições e talvez um documento assinado por todos.
A FLIP nos oferece 3 tipos de pacotes com embalagens e conteúdos diversos. O primeiro é o ‘Pacote Pensamento’, que uma vez aberto pode trazer a ventania da polêmica, ou ao menos uma racionalização teórica, ensaística, sobre aspectos intelectualizáveis da literatura. Portanto, o pacote mais próximo do que seria um ‘debate’, como ideal a ser atingido. Neste caso estão Antonio Candido, Jose Miguel Wisnik, João Cezar de Castro Rocha, e outros, que falaram sobre Oswald de Andrade, ou Miguel Nicolelis e Luiz Felipe Pondé, que nos brindaram com a polêmica mais vibrante e provocativa da FLIP, sobre tecnologia e filosofia e religião. Neste último caso, não por acaso, muitos se retiraram antes do fim, protestando talvez contra o ateísmo declarado dos dois.
O segundo é o ‘Pacote Lançamento’. Obras recém-lançadas têm seus autores convidados para falar sobre elas. Nesse caso, o pensamento não é primordial, troca-se o vento da polêmica pela brisa dos procedimentos literários, das escolhas estéticas que quase nunca são justificadas, antes se diz que a obra é que impõe certas escolhas, ou que aqueles personagens tomaram rumo próprio, deixando o impotente autor à sua mercê.  Neste caso estão o húngaro Péter Esterházy e o francês Emmanuel Carrère, que explicaram como suas obras foram permeadas por fatos reais, até mesmo à sua revelia. Explico: depois de ter publicado uma obra fortemente autobiográfica, Esterházy descobriu que seu pai tinha sido um agente da polícia secreta comunista, e isso o levou a escrever rapidamente um segundo livro. Carrère tornou pública parte de sua vida pessoal e familiar, desagradando à sua mãe e sua namorada. Outros lançamentos, como o livro sobre Elizabeth Bishop, de Michael Sledge, e de brasileiros como Edney Silvestre, Marcelo Ferroni e Teixeira Coelho, foram apenas protocolares, pois os autores não conseguiram mostrar porque suas obras merecem ser lidas.
O terceiro é o ‘Pacote-Autor’, que traz, é claro, o autor como foco maior de interesse. O mais óbvio exemplo é João Ubaldo Ribeiro, que aproveitou para fazer revelações (por exemplo, Viva o Povo Brasileiro foi escrito principalmente para ser um livro grosso, e ele não gosta de Guimarães Rosa), e deixar que o público cultuasse (tietasse?) sua personna artística.
Outro autor que foi cultuado - até ser execrado - foi Claude Lanzmann , que veio falar de suas memórias, falou também do seu documentário sobre o Holocausto, mas ficou insistentemente brigando com o apresentador, e fez grande parte do público deixar o local.

O melhor então seria escolher um pacote que viesse com mais de um recheio. A abertura com Antonio Candido serviu para alimentar o debate, mas a própria figura do crítico foi muito cultuada, embora ele não seja escritor. Esse caso, em que o carisma do estudioso é grande o suficiente para levar o público a lotar a tenda dos autores, é uma exceção, sublinhe-se. É possível que a mesa com David Byrne talvez tenha sido bastante recheada, com um lançamento, um debate em torno do urbanismo sustentável, e também a sua presença, ele que já foi líder de uma banda de sucesso. Mas como eu não vi, nada digo.
Lamento apenas ter perdido o português valter hugo mãe (é com minúscula mesmo), pois ele emocionou a platéia, se tornou um dos mais comentados pelo público, e ofuscou completamente a argentina Pola Oloixarac (eta nominho!). Mas não dá tempo para tudo, juro.

Fica então um desafio para as próximas edições da FLIP: que a organização consiga achar um Autor (ou Autora) conhecido, que este possa falar de um Lançamento, e que provoque a plateia com seu Pensamento. Seria um incomparável Pacote Triplo, que não poderia deixar de satisfazer todos os gostos e atender a todas as expectativas. A relação custo/benefício seria irresistível. O desafio está lançado.

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